1. Vigência
Os
três planos do mundo jurídico são o da existência (a lei, uma vez promulgada,
tem existência jurídica), o da validade (uma vez vigente, tem validade) e o da
eficácia (quando apta a produzir efeitos).
Art.
101 do CTN: a vigência, no espaço e no tempo, da legislação tributária rege-se
pelas disposições legais aplicáveis às normas jurídicas em geral, ressalvadas
as exceções previstas nos arts. 102 a 104 e 106.
Lei
de Introdução ao Código Civil (LICC): seu art. 1º, caput, determina que salvo
disposição em contrário (a lei pode dispor que entrará em vigor na data de sua
publicação, em data determinada ou depois de determinado tempo, após sua
publicação – o intervalo que pode ocorrer entre a publicação e a vigência da
lei denomina-se vacatio legis), a lei começa a vigorar, em todo o país,
45 dias depois da publicação. Esta seria a regra geral que se tornou exceção,
de vez que a grande maioria das leis contém dispositivo sobre sua vigência.
Existe
disposição especial sobre a entrada em vigor das normas complementares da
legislação tributária. Assim, salvo disposição especial delas constantes, os
atos normativos expedidos por autoridades administrativas entram em vigor na
data de sua publicação. As decisões dos órgãos unipessoais ou colegiados de
jurisdição administrativa, trinta dias após sua publicação; e os convênios
entre os entes de direito público (União, Estados, Distrito Federal e
Municípios), na data neles prevista, tudo nos termos do art. 103 do CTN.
O
art. 104 erra ao dizer que “entram em vigor no primeiro dia do exercício
seguinte os dispositivos de lei que instituem ou majoram impostos”. Tais
dispositivos entram em vigor na data que decorrer da aplicação das regras sobre
vigência que estudamos acima; aliás, na mesma data que entrar em vigor a lei de
que fazem parte. Também não prospera a abrangência do dispositivo “a impostos
sobre o patrimônio e a renda”, alcança quaisquer tributos, apenas com as exceções
previstas na própria Constituição (impostos de importação e exportação, IPI,
IOG, etc.).
Quanto
às isenções, não há requisito constitucional de observância de regra de
anterioridade para sua revogação; assim, a previsão é apenas em nível de lei
complementar, restrita às isenções relativas a impostos sobre o patrimônio e a
renda. Já a vigência da lei tributária
observa o princípio da territorialidade. Isto é, a lei vige, em princípio, no
território da pessoa jurídica de direito público que a editou. Excepcionalmente,
a lei federal brasileira poderá ser aplicada no estrangeiro.
2. Aplicação
A
regra geral sobre aplicação de leis encontra-se no art. 6º, caput, da Lei de
Introdução: as leis não retroagem, mas têm efeito imediato e geral. Tal se
aplica, como regra geral, às leis tributárias.
Todavia,
o CTN contém algumas disposições especiais a respeito do tema. Diz o art. 105
do CTN: “A legislação tributária aplica-se imediatamente aos fatos geradores
futuros e aos pendentes (aqueles cuja ocorrência já se iniciou, mas ainda não
se completou), assim entendidos aqueles cuja ocorrência tenha tido início, mas
não esteja completa nos termos do art. 116”. Exemplo é o do Imposto de renda
apurado na declaração, cujo fato gerador, quando à pessoa física (pessoa jurídica
é trimestral), permanece anual: adquirir disponibilidade econômica ou jurídica
de renda no decorrer do ano. Assim, em qualquer data intermediária, o fato
gerador do imposto de renda estará pendente.
A
retroatividade é hoje vedada na norma constitucional expressa (art. 150, III,
a), que proíbe a exigência de tributos “em relação a fatos geradores ocorridos
antes do início da vigência da lei que os houver instituído ou aumentado”.
O art. 144 do
CTN, caput, diz: “O lançamento reporta-se à data da ocorrência do fato gerador
da obrigação e rege-se pela lei então vigente, ainda que posteriormente
modificada ou revogada”. Explique-se: quanto ao direito tributário material
(definição do fato gerador, contribuinte, base de cálculo, alíquota, deduções,
correção monetária) aplica-se a lei vigente no momento do fato gerador. No que
toca ao direito tributário formal (critérios de apuração, processos de
investigação, procedimento administrativo, poderes de investigação de
autoridades administrativas) aplica-se a lei vigente ao tempo do lançamento,
pois aqui se trata de procedimentos administrativos de apuração e fiscalização.
Ainda no que toca
à aplicação da lei tributária, o art. 106 do CTN determina que se faça
retroativamente, no caso de leis interpretativas ou da chamada “retroatividade
benigna”, quando se tratar de infração ou ato não definitivamente julgado.
Lei
interpretativa: fixa, por lei, uma das interpretações existentes, como aquela a
ser adotada. Essa lei será aplicada retroativamente para que a interpretação
legalmente adotada aplique-se aos fatos geradores ocorridos na vigência da lei
interpretada, nos termos do art. 106, do CTN, excluída a aplicação de
penalidade à infração dos dispositivos interpretados – é que se havia
controvérsia efetiva a respeito da interpretação da lei, tanto que se fez
necessária a edição de lei para ficar sua exegese, não pode ser punido o
contribuinte por ter adotado, antes que a lei interpretativa fixasse-a, outra
interpretação possível.
Retroatividade
Benigna: tratada pelo inciso II do art. 106, a norma, frise-se, só se aplica a
penalidades. É aplicação ao direito tributário penal do princípio de direito
penal, segundo o qual a lei que favorece o agente aplica-se retroativamente.
Porém, no tributário penal a lei que beneficia o infrator é bem mais limitada
do que em direito penal, pois a lei mais benéfica só retroage tratando-se de
ato não definitivamente julgado na esfera administrativa ou na judicial
(inclusive quando já julgados embargos do devedor, desde que não ocorrida a arrematação),
e apenas nas hipóteses previstas no inciso II do art. 106 (deixar de definir
infração ou cominar penalidade menos severa).
Por derradeiro, a
retroação da lei que extinguir infrações ou reduzir penalidades ocorrerá apenas
no que tange à multa ou outra sanção. Só estas podem ser abolidas ou reduzidas.
O tributo será sempre devido e reger-se-á pela lei vigente quando ocorreu o
fato gerador.
3. Interpretação
Para
a doutrina tradicional, na atividade de interpretação, o hermeneuta buscará
aclarar o significado da lei, para eliminar dúvidas na sua aplicação. Para
Kelsen, a aplicação do direito não pressupõe mera interpretação da lei, mas
sempre criação de normas jurídicas. A diferença é que o aplicador do direito
(administrador ou juiz) cria normas individuais e concretas, enquanto o
legislador cria normas gerais e abstratas.
Constituição Federal
Lei Complementar
Lei Ordinária
Decretos
Criação de Normas Individuais e Concretas
pelo Aplicador do Direito
A
essa atividade não é possível negar o caráter criativo. Basta ter em mira que,
de uma mesma norma, pode-se, com facilidade, chegar a interpretações
diferentes, que levarão a diferentes conseqüências jurídicas.
Examinemos
os diversos métodos de interpretação:
·
Interpretação literal ou gramatical. É sempre o
primeiro método de interpretação utilizado, mas também o mais pobre. É a
atividade de leitura do texto legal e de sua compreensão pelo significado, na
língua, de cada um dos vocábulos utilizados.
·
Interpretação lógica ou sistemática. Busca-se integrar
o preceito sob interpretação dentro do sistema jurídico a que pertence e dele
extrair conclusão compatível com o conjunto do ordenamento naquele ramo do
direito.
·
Interpretação teleológica. É aquela que
busca o fim visado pela norma. Interpreta-se a norma jurídica tendo em mira o
objetivo a ser alcançado com a edição da norma.
·
Interpretação histórica. Procura identificar os elementos
que, historicamente, cercaram a elaboração da lei. Procura se situar no
contexto histórico do tempo de elaboração da lei e desvendar, pelas idéias
vigentes àquele momento e pelos debates legislativos sobre sua elaboração, qual
o objetivo visado pela norma. Porém, a intenção do legislador não é elemento
decisivo na interpretação da lei. Uma vez completo o processo de elaboração da
lei, ela se torna independente do seu criador; significa que ela (lei)
objetivamente diga, ainda que não expresse exatamente aquilo que o legislador
(elaborador da lei) pretendeu dizer.
O direito
tributário é direito comum. Na interpretação das leis tributárias pode se usar
qualquer dos métodos estudados. Usar-se-á apenas o método literal de
interpretação somente quando a lei assim expressamente determinar, previstas no
art. 111 do CTN: se interpreta a lei tributária (com exclusão dos demais
métodos) que dispõe sobre suspensão ou exclusão do crédito tributário
(previstas nos arts. 151, suspensão: moratória, depósitos, reclamações e
recursos administrativos, medidas liminares e parcelamento; e 175, exclusão:
isenção e anistia), outorga de isenção ou dispensa do cumprimento de obrigações
acessórias.
Na dúvida,
segundo o art. 112 do CTN, lei tributária que define infrações ou impõe
penalidades interpreta-se favoravelmente ao acusado.
A interpretação
das leis tributárias não se faz a favor ou contra o fisco, mas pela aplicação
das regras de interpretação. Também não prevaleceu a chamada “interpretação
econômica”, segundo a qual a interpretação das leis tributárias deveria se
guiar pelos efeitos econômicos buscados pelas partes, desconsiderando-se as
formas jurídicas empregadas. Não se pode ignorar o conteúdo jurídico do ato,
para valorar apenas seu fim. Entre duas diferentes formas jurídicas de obter o
mesmo efeito econômico (receber um crédito em conta corrente bancária, com a
ocorrência do CPMF ao sacá-lo ou recebe-lo em dinheiro, por exemplo), pode o
contribuinte optar por aquela que gera menos ônus fiscais ou evita a ocorrência
do fato gerador.
Finalmente,
segundo o art. 118 do CTN, para o direito tributário é irrelevante a
legalidade, a validade dos atos praticados perante outros ramos do direito e
sua moralidade ou conformação aos chamados “bons costumes”. Assim, são
tributáveis os rendimentos auferidos de atividades ilegais como o “jogo do
bicho”, o exercício ilegal de profissão, ou consideradas contrárias à moral,
como a prostituição. A lei não define a prática de ato ilícito como hipótese de
incidência de tributo (salvo finalidade extrafiscal de desestímulo a sua
prática), mas sim determina hipótese de incidência.
4. Integração
O
art. 108 do CTN estatui: “Na ausência de disposição expressa, a autoridade
competente para aplicar a legislação tributária utilizará, sucessivamente, na
ordem indicada: I – a analogia; II – os princípios gerais de direito
tributário; III – os princípios gerais de direito público; IV – a eqüidade”.
à Analogia. Consiste em
aplicar para o fato não expressamente previsto em lei norma expressa existente
para caso semelhante. Há, porém, ressalva expressa no art. 108, §1º, do CTN de
que o emprego da analogia não poderá resultar na exigência de tributo não
previsto em lei.
à Princípios
gerais do direito tributário. Estão previstos na Constituição e no CTN.
Legalidade tributária, da anterioridade, da universalidade, da isonomia
concreta, da irretroatividade, da capacidade contributiva, etc.
à Princípios
gerais de direito tributário. São as normas cuja função norteadora não
se limita ao ramo do direito tributário, mas abrange todo o direito público.
Tais princípios encontram-se, em sua maioria, constitucionalizados e são, entre
outros, os princípios de proporcionalidade, razoabilidade, igualdade,
impessoalidade, responsabilidade, moralidade, publicidade, eficiência,
representação, federação, devido processo legal.
à Eqüidade. Significa
justiça. É a decisão pelo senso de justiça do julgador, interpretando o
conceito de justiça prevalente na sociedade em que está integrado. Nos termos
do art. 108, §2º, do Código, o emprego da eqüidade não poderá resultar na
dispensa do pagamento do tributo devido. Porém, o art.172, IV, do CTN dispõe
que a lei pode autorizar a autoridade administrativa a conceder, por decisão
fundamentada, remissão (perdão) total ou parcial do crédito tributário. A
contradição é apenas aparente. O perdão do crédito tributário por eqüidade
depende de expressa autorização legal. O que a autoridade administrativa (ou
juiz) não pode é dispensar o pagamento de tributo, por eqüidade, sem lei que
expressamente o autorize a tal.
à Os princípios
gerais do direito privado. Utilizam-se somente para a definição o conteúdo ou o
alcance dos institutos, conceitos e forma de direito privado, utilizados pelo
direito tributário, como prescrição, decadência, pagamento, quitação,
compensação, quando utilizados pelo direito tributário. O uso dos princípios
gerais de direito privado não é meio de integração da legislação tributária.
Ainda, utilizando
conceito e forma de direito privado, o direito tributário pode alterar-lhes os
efeitos, ou seja, por regra expressa atribuir a um instituto (de direito
privado) conseqüências tributárias diversas daquelas que dele decorrem no
direito civil ou comercial. Assim, é lícito uma pessoa jurídica atribuir o
pró-labore que entender a seus administradores, mas só poderá abate-lo do lucro
real para fins de imposto de renda, até o limite admitido pelas leis
tributárias.
Todavia, a lei
tributária não pode alterar, mesmo para fins tributários, institutos, conceitos
e formas de direito privado utilizados expressa ou implicitamente, pelas
Constituições Federal ou Estaduais ou pelas Leis Orgânicas do Distrito Federal
ou dos Municípios, para definir ou limitar competências tributária, isto seria
inconstitucional.
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