Os ricos do Brasil são muito mais ricos do que você imagina. São
super-ricos. E ficam mais e mais ricos a cada dia que passa. Existem duas
razões principais para isso. Os impostos da classe média e dos pobres vão para
o bolso dos ricos. E os ricos pagam menos imposto que a classe média e os
pobres.
Só agora a gente está entendendo quem são os super-ricos do
Brasil. A análise tradicional, feita com as pesquisas do IBGE, não dão conta da
realidade. Um novo estudo realizado pelos economistas Rodrigo Orair e Sérgio
Gobetti, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), chega mais perto.
Eles analisaram os dados das declarações de imposto de renda das pessoas
físicas. As conclusões são chocantes.
Segundo o IBGE, a renda média do 1% mais rico do país foi de
R$ 214 mil em 2012. Mas segundo o estudo do IPEA, a renda anual do 1% mais rico
é aproximadamente R$ 575 mil. Explicação: o IBGE não capta toda a renda das
pessoas mais ricas, que tem muitas rendas provenientes do capital (como
aplicações financeiras, aluguéis, lucros e dividendos).
R$ 575 mil já é uma boa grana: mais de R$ 40 mil por mês.
Mas esses 1% ainda não são a elite. Os super-ricos do Brasil ganham acima de
160 salários mínimos por mês. São 0,05% da população economicamente ativa.
Os super-ricos brasileiros possuem um patrimônio de R$ 1,2
trilhão. Isso é 22,7% de toda a riqueza declarada por todos os contribuintes do
Brasil. Essas 71.440 pessoas têm renda anual média de R$ 4.17 milhões, uns R$
350 mil por mês. Tiveram em 2013, ano analisado pela pesquisa, um rendimento
conjunto de R$ 298 bilhões.
E em 2015? Não sabemos, mas é seguro dizer que estão bem
mais ricos que em 2015. Quem tem muito capital investe e recebe rendimentos
financeiros enormes. Os juros no Brasil são sempre muito altos, mas agora estão
estratosféricos. Trabalhar não tem nada a ver com a fortuna crescente dessa
turma. Neste nível de renda, trabalha quem quer, não porque precisa.
Qual o negócio mais lucrativo e seguro do Brasil? Emprestar
dinheiro para o governo. No Brasil, como na maioria dos países, as contas públicas
não fecham no final do ano. Se você tem muita grana, não precisa de
criatividade para enriquecer mais e mais. Basta comprar títulos públicos do
governo, que paga juros altíssimos para financiar sua dívida. E de onde vem
esse dinheiro para pagar os juros? Do Tesouro Nacional, dos impostos que todos
os brasileiros pagam.
Mas alguns pagam mais que outros. O detalhe mais cruel sobre
a desigualdade brasileira está aí. Os super-ricos brasileiros, esses que ganham
mais de 160 salários mínimos por mês, pagam só 6,51% de sua renda de imposto de
renda. Você leu certo. Um assalariado que ganhe R$ 5 mil por mês paga 27,5% de
imposto de renda. A elite paga 6,51%, como demonstra o estudo do IPEA.
Como isso é possível? É que 65,8% da renda total desses
super-ricos são rendimentos considerados isentos e não-tributáveis pela
legislação brasileira. É o caso dos dividendos e lucros. Na prática, o imposto
de renda aqui só é progressivo do pobre até a classe média, que é justamente a
fatia da população que mais paga imposto de renda. É uma receita perfeita para
aumentar cada vez mais a desigualdade social no Brasil. É garantia de
injustiça, ignorância, violência. E até de atraso em outros campos. Se fala
muito que o Brasil tem pouca inovação tecnológica, mas quem vai arriscar
capital investindo em inovação, se você pode faturar com juros altos e não
pagar quase nada de imposto?
Essa bizarria cruel é criação brasileira. Todos os países
decentes, sejam ricos ou emergentes, tributam todos os rendimentos das pessoas
físicas. Não interessa se a renda do salário, de aluguel ou de dividendos. É o
justo. É o mais eficiente para o bom funcionamento dos países.
O estudo do IPEA não captura com precisão absoluta a
pirâmidade social brasileira. Não dá conta de dinheiro escamoteado, de caixa 2
ou remessas enviadas ao exterior. Mas já dá uma noção do tamanho do escândalo.
Agora, como é focado no Imposto de Renda, não leva em consideração outra grande
injustiça do nosso sistema tributário, que são os impostos indiretos.
Os super-ricos pagam o mesmo imposto sobre produtos que
você, eu ou a vovó que recebe Bolsa Família. Pagam o mesmo imposto pelo arroz,
o café, o remédio, o fogão. Isso significa que proporcionalmente o pobre paga
muito mais imposto a classe média. E infinitamente mais que a elite.
Os super-ricos não são os vilões dessa história. As regras
estão aí para beneficiá-los. Não é ilegal. Certamente há na elite gente que
topa abrir mão de suas vantagens, em benefício de quem mais precisa... Mas,
como era de se esperar, existem super-ricos que atuam diretamente para que esse
estado de coisas continue exatamente assim: juros altíssimos e taxação mínima.
Basta isso para os donos do capital ficarem mais e mais ricos a cada ano que
passa, sem trabalho, sem esforço, sem contribuir para o país.
Os super-ricos têm muito poder. Influenciam muito no debate
político e econômico. Abundam na imprensa argumentos a favor de que as coisas
se mantenham como são. E são super-ricos os financiadores das campanhas da
maioria dos políticos, claro.
A recessão radicaliza a injustiça. Penaliza o trabalhador e
o empreendedor, o importador e o exportador, o estudante e o aposentado. Esta
recessão não veio do espaço sideral. Foram tomadas decisões erradas no passado?
Claro, muitas, desde 1500. Mas não dá para mudar o passado. O futuro felizmente
está ao nosso alcance.
Esse ano e os próximos serão muito difíceis. O
cenário internacional é hostil. O cobertor está curto. É imoral e improdutivo
continuar enriquecendo 0,5% com o dinheiro dos impostos dos 99,5%. Enfrentar os
privilégios dos super-ricos é a pauta política e econômica fundamental de 2015
e dos próximos anos. O resto é resto.
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